Novela

Indignada, rompi a rotina saindo do meu horário de trabalho e fui para casa, onde ele se encontrava trabalhando no escritório. Ao me ver, deu um pulo súbito de susto e tentou esconder os documentos e papéis desorganizados de forma disfarçada. Percebi certa falsidade em seu sorriso com minha inesperada visita. Perguntei se estava tudo bem, ele disse que sim e saiu nervoso para tomar um copo d’água. Silenciosamente abri as gavetas e roubei os documentos, subindo com eles para o hall onde eu poderia lê-los sem a interferência do meu marido. Fiz outra descoberta assustadora: meu marido tinha contas em paraísos fiscais, ele desviava o dinheiro de nossa empresa. Não aguentei, desci correndo e esbarrei a prova do crime em sua cara, queria explicações por mais evidente que se declaravam os fatos. Paulo me deu um olhar gélido e amargo, não queria falar; até que mencionei a descoberta de sua luta comunista. Foi aí que ele desembuchou tudo e pude fazer a terceira descoberta do dia, como também a resposta para a origem desta vida tão luxuosa. Durante a ditadura, Paulo fora um dos líderes de uma “falsa” organização comunista, que arrecadava dinheiro de seus seguidores que apostavam na sua capacidade de assumir futuros cargos políticos. O dinheiro arrecadado seria o feitor de nossa empresa. Descobri ainda que o dinheiro desviado é um bem de acionistas traidores, os quais se opuseram ao movimento de Paulo na época.

Toda a energia dentro de mim foi então gasta com uma discussão árdua e violenta, chorando de indignação pelo caráter inexistente de meu marido. Eu posso admitir minha posição capitalista e talvez até meio fútil às vezes, mas egoísta, gananciosa e ladra nunca fui e nunca aceitaria um marido assim. Paulo disse estar com medo de me perder, ou talvez dado por sua alta capacidade de manipulação, estaria com medo de ser entregue a polícia, assim tentando me fazer mudar de foco. Ele depois me mostrou outro documento, no qual todos os bens roubados se encontravam em meu nome. Senti-me como um objeto, um meio para ele se safar. No papel eu era conhecida como a ladra, a culpada pelo desvio do dinheiro. Teria ele se casado por interesse? Não sabia mais em que acreditar. O encarei, respirei fundo até chegar uma onda enérgica com a decisão: o divórcio. Não queria mais explicações. Vivi uma mentira, o Paulo que conheci era uma farsa.

Começo

Conjunto Nacional