IV Congresso do Colégio Santa Cruz jan/17

O papel do erro na aprendizagem escolar


O que a prática cotidiana do professor ilumina do processo de aprendizagem do aluno? Como trabalhar a conotação negativa dos erros? Como propiciar um percurso avaliativo em que o aluno se sinta mais seguro para ousar, errar e recriar durante a sua trajetória escolar?

Fragmento de quatro minutos do vídeo.

CarolDweck_editado2 from Colégio Santa Cruz on Vimeo.

The power of believing that you can improve
TED Talk da Profª Carol Dweck, Nov. 2014 – Professora da Universidade de Stanford e Ph.D. Social and Developmental Psychology, Yale University, 1972. https://www.ted.com/talks/carol_dweck_the_power_of_believing_that_you_can_improve?language=pt-br
Acesso em: 16 janeiro 2017.

“My work bridges developmental psychology, social psychology, and personality psychology, and examines the mindsets people use to understand themselves and guide their behavior. My research looks at the origins of these mindsets, their role in motivation and self-regulation, and their impact on achievement and interpersonal processes”.

Trecho da entrevista de Charles Hadji para a revista Nova Escola.

Entrevistador: Qual é a importância do erro na escola e como o professor o utiliza em sala de aula?

Hadji:Para que o aluno aprenda, é preciso aceitar que ele erre. Mas o papel da escola e do professor é evitar erros inúteis. O importante é fazer com que os alunos confiem em sua capacidade de desenvolvimento positivo, tornando-os progressivamente senhores de seu desenvolvimento. Isso é a conquista da autonomia. O erro não deve ser considerado uma falha, mas algo que tem sentido e pode ajudar a ensinar. Ele é um indicador de como o aluno raciocina. O professor pode se organizar para que todos façam o menor número de erros possível escolhendo bem as situações de aprendizagem, com níveis de dificuldade coerentes com a capacidade da turma. Ao ensinar a criança a nadar, por exemplo, não podemos levá-la ao mar bravo. É quase certo que ela terminará por afundar e se engasgar. E ainda vamos dizer: "Infeliz! Não é assim que se faz!" Essa criança deve começar suas aulas numa piscina. A piscina é a escola. É um meio que protege, mas que assim mesmo traz a dificuldade essencial, que é a água. Os erros, como afundar ou engasgar, são naturais. Mas com o tempo ela passará a mergulhar de cabeça, boiar, nadar...

Entrevistador: Muitas escolas parecem preferir se comportar como o mar bravo.

Hadji: Sim, isso ocorre com frequência, quando os professores oferecem situações não organizadas. Mar bravo é o professor que impõe as mesmas coisas a todos, aquele que se recusa a ver o nível real de cada um e se fixa só no programa. Assim, ele condena a turma a nadar em mar aberto. O professor deve ser um organizador, que vai limitar as dificuldades e, em consequência, reduzir os erros, permitindo aos alunos fazer sempre tentativas inteligentes que lhes permitirão realmente aprender. Isso ocorre quando há uma dificuldade a superar que não é insuperável. Do contrário, o estudante fica numa situação de fracasso humilhante. O professor inteligente é aquele que confia na inteligência de cada um em sua turma.

Fragmento de trabalho: Erro na avaliação da aprendizagem: desvelando concepções.
Márcia L. Cestari, Miriam Sibilia e Nádia A. Souza. Apresentado no I Fórum de professores de didática do Paraná na Universidade Estadual de Londrina em 2007.

A ideia do trabalho foi pesquisar como professores, em formação inicial, concebem o erro e como a ele reagem. Para tanto, procurou-se analisar, em produções pictóricas realizadas pelos futuros docentes, o potencial imobilizador e mobilizador do erro na superação das dificuldades de aprendizagem, tendo por baliza os sentimentos dele decorrentes.

Dentre os desenhos analisados, foi possível perceber o percentual de ocorrência em que os sentimentos imobilizadores são relatados, demonstrando como o erro é percebido e interiorizado como algo ruim, desqualificador, que classifica e culpa o aluno pelas próprias dificuldades, pelos próprios “fracassos” (Figuras 1 a 6).

Figura 1 a 6 – Representações de sentimentos expressos frente ao erro.
Fonte: Dados de pesquisa. Londrina, 2011.

Nessas representações, um aspecto se revela inalterável: a expressão triste dos semblantes. Tristeza que se soma à raiva, à sensação de inferioridade, à vergonha e à dor. Tristeza que se revela na boca silenciada ou em um ser desfigurado e nocauteado. Tristeza traduzida no corpo vergado pelo peso da impossibilidade e da desesperança. O erro traduz a incapacidade para aprender e para responder adequadamente ao instituído como padrão. (...)

Para Luckesi (1995, p. 136), “[...] o erro poderia ser visto como fonte de virtude, ou seja, de crescimento, o que implicaria estar aberto a observar o acontecimento como acontecimento, não como erro; observar o fato sem preconceito, para dele retirar os benefícios possíveis”. Aparentemente, é isso o que fazem esses outros participantes (em número bem menor), pois reagem de maneira proativa, declarando ter no erro um momento de paragem, reflexão e busca por superações, apesar de revelarem-se surpresos ou descontentes face sua ocorrência (Figuras 13, 14 e 15).

Figura 13, 14 e 15 – Representações de sentimentos expressando reações positivas frente ao erro
Fonte: Dados de pesquisa. Londrina, 2011.

Do preto ao amarelo e, finalmente, ao vermelho, a folha de sulfite foi pintada. Da escuridão ao início da luz, mas luz que traz o alerta representado pelo vermelho a revelar, minimamente, dois compromissos: atenção e superação. Em outra folha, a região da testa, em um rosto preocupado, é destacada e abriga um ponto de interrogação azul antecedendo um sol que se anuncia na beirada: questionamento e vislumbre de possibilidades são as ideias reveladas pelas palavras lançadas no verso. A terceira representação conta uma história, vivenciada por muitos – mesmo que o desejado é que o fosse por todos – quando ocorre o erro: primeiro, surpresa e questionamento, depois, reflexão e alegria pelo delineamento de caminho permeado pelo compromisso com a superação. O erro não é negado. Ele é valorizado, pois compreendido como revelador de uma fase – pequena, ínfima – de um processo muito longo no decorrer do qual a aprendizagem vai sendo edificada.

A apresentação da profª Carol Dweck e a entrevista com o prof. Charles Hadji indicam que o tratamento concedido ao erro no espaço escolar acaba por fixar lugares e papéis para professor e aluno nem sempre os mais desejáveis (para o professor, que quer ser visto como caminho para a aprendizagem) e construtivos (para o aluno, que precisa acreditar que pode aprender e desenvolver-se com os desafios). Como poderíamos trabalhar melhor a questão do erro na escola? Em que situações escolares o erro pode ser percebido de maneira mais construtiva e natural no processo de aprendizagem? Há situações de avaliação em que isso ocorre? Quais?